Artigo: a necessidade do professor de artes marciais saber diferenciar abuso e assédio sexual para orientar os alunos

Artigo: a necessidade do professor de artes marciais saber diferenciar abuso e assédio sexual para orientar os alunos

* Ao receber crianças e adolescentes em suas respectivas academias, vocês, mestres e professores, precisam entender a complexidade desses seres humanos e não somente vê-los como um número resultante das mensalidades futuras. E muito mais do que uma sequência de treinos, precisam ajudá-los em suas dificuldades emocionais e direcioná-los da melhor forma possível quando encaram um problema.

Sabemos que existem mestres competentes e estudiosos, e que também existem mestres negligentes. Não podemos fechar os olhos diante dos absurdos que tem acontecido nos últimos anos, como preconceitos em todos os âmbitos, discriminação em relação às mulheres nas artes marciais, assédio sexual, agressividade sem medidas, insultos entre lutadores, abuso sexual e tudo embaixo dos nossos olhos. Cada escândalo que surge gera um impacto, mas não pode ser somente um momento de indignação, precisamos diminuir a cada dia esses atos cruéis que tem acontecido e que infelizmente ainda acontecem no esporte.

Precisamos refletir sobre as nossas atitudes. Impossível você, professor e mestre, receber uma criança ou um adolescente no seu treino, e se esse aluno apresentar comportamentos alterados, você não ter a sensibilidade e o conhecimento para intervir e ajudá-lo. Hoje eu irei falar sobre as diferenças entre abuso sexual e assédio sexual, e suas consequências. Acredito que, quando as crianças e os adolescentes são orientados de forma responsável e saudável, muitos comportamentos inadequados serão evitados.

O trabalho preventivo é essencial para evitar escândalos e doenças psíquicas incuráveis. Espero que a partir desse artigo, vocês possam inserir nos treinos temas importantes como este para debate e também para ajudar os seus alunos. Vamos começar entendendo o abuso sexual e as suas consequências. 

O fenômeno do abuso sexual é universal, atingindo todas as classes sociais e idades, incubando, na vítima, a predisposição para perpetuar o ciclo de violência ao qual foi submetida (Pfeiffer & Salvagni, 2005). A definição de abuso sexual, segundo a Organização Mundial da Saúde (1999), refere-se ao envolvimento da criança em atividade sexual para qual ela não tem condições, capacidade ou está desenvolvida para compreender e consentir e, em termos amplos, fere as leis ou tabus sociais. Além disso, a OMS destaca o aspecto relacional entre criança e o adulto ou mesmo outra criança que, pela idade ou desenvolvimento, situam-se em uma posição de responsabilidade, confiança ou poder, e têm intenção de se satisfazer.

Tais situações podem ser atos coercivos de indução em atividades sexuais ilegais, prostituição e exploração pornográfica (OMS, 1999). Nesse sentido, fundamentalmente, o abuso sexual consiste no envolvimento da criança em atividades de manipulação dos órgãos genitais infantis ou do agressor, abusos verbais, masturbação, ato sexual genital ou anal, estupro, sodomia, exibicionismo, pornografia, e ainda exibicionismo, voyeurismo, exposição a filmes ou imagens (Amazarray & Koller, 1998; Pfeiffer & Salvagni, 2005). 

As características epidemiológicas indicam que o maior número de casos ocorre na população feminina e tem origem intrafamiliar, sendo a faixa etária com maior incidência entre cinco e dez anos de idade (Amazarray & Koller, 1998; Habigzang e cols., 2005). Apesar dos diferentes aspectos envolvidos, há consenso na compreensão do abuso sexual, como uma situação traumática e que, necessariamente, envolve uma questão de poder, ou seja, um indivíduo que impõe o seu desejo a outro de faixa etária inferior a sua (Araújo, 2002; Habigzang, Koller, Azevedo & Machado, 2005; Pfeiffer & Salvagni, 2005).

Araújo (2002) considera que, nos casos de violência sexual intrafamiliar, pode-se observar uma disfunção em pelo menos três níveis: o poder exercido pelo grande (forte) sobre o pequeno (fraco), a confiança que o pequeno (dependente) tem no grande (protetor) e o uso perverso da sexualidade, na qual um se apodera do corpo do outro e o usa segundo seu desejo. Sendo o abuso sexual um problema complexo e difícil de ser apreendido em sua totalidade, torna-se extremamente complicado, tanto para a criança, quanto para a família, o processo de reconhecimento e a denúncia desse tipo de violência que ocorre. Comumente, constata-se que famílias abusivas tendem a reproduzir a cultura do silêncio, em que o abuso sexual acaba sendo mantido por todos, de maneira cruel e em segredo, passando várias gerações sem ser descoberto.

As consequências do abuso sexual em crianças de 0 a 6 anos: sabemos que muitas academias já têm alunos com a idade de três anos. As manifestações mais comuns resultantes da vitimização por abuso sexual caracterizam-se pela presença de ansiedade, pelos pesadelos, pelo transtorno de estresse pós-traumático e pelo comportamento sexual inapropriado.

As consequências do abuso sexual em crianças de 7 a 12 anos: os sintomas mais comuns abarcam o medo, os distúrbios neuróticos, a agressão, os pesadelos, os problemas escolares, a hiperatividade e o comportamento regressivo.

As consequências do abuso sexual em adolescentes de 13 a 18 anos: observa-se a depressão, o isolamento, o comportamento suicida, a autoagressão, as queixas somáticas, os atos ilegais, as fugas, o abuso de substâncias licitas ou ilícitas e o comportamento sexual inadequado (Amazarray & Koller, 1998; Furniss, 1993).

Vamos para o próximo tema: “Assédio Sexual”

Assédio sexual inclui qualquer comportamento sexual indesejado, mas às vezes pode ser difícil perceber a diferença entre brincadeira, flerte e assédio sexual. O assédio sexual pode ocorrer em diferentes lugares, como no trabalho, em casa, escola, academias, na igreja e etc. Tanto a pessoa que assedia como a pessoa que é assediada podem pertencer a qualquer gênero sexual.

Nota: de acordo com um estudo conduzido pela OIT (Organização Internacional do trabalho), “o assédio sexual está intrinsecamente ligado com o poder e na maioria das vezes acontece em sociedades em que a mulher é tratada como objeto sexual e cidadãs de segunda classe”. Um exemplo clássico é quando é pedido às mulheres favores sexuais em troca de trabalho, de promoção ou aumento salarial. Outro exemplo é o assédio sexual de rua, que pode ir desde sons e assobios, palavras ofensivas ou até abuso e violação sexual.

Existem diferentes definições legais para assédio sexual em diferentes países e jurisdições, mas as formas mais comuns de assédio sexual incluem algumas das situações listadas abaixo:

  • Contar piadas com caráter obsceno ou sexual, mostrar e partilhar imagens explicitamente sexuais;
  • Cartas, notas, e-mails, chamadas telefônicas ou mensagens de natureza sexual;
  • Avaliar pessoas pelos seus atributos físicos; comentários sexuais sobre a forma de vestir ou de parecer;
  • Assobiar ou fazer sons inapropriados; fazer sons de natureza sexual ou gestos;
  • Ameaças diretas ou indiretas com o objetivo de ter relações sexuais, convidar alguém repetidamente para ter sexo ou para sair, isso sem consentimento; 
  • Olhar de forma ofensiva;
  • Tocar, abraçar, beijar, cutucar ou encostar-se a alguém. O assediante pode ser um empregador, um colega, um cliente, um estranho, um familiar, um falso amigo, um grupo de pessoas ou até uma pessoa entrevistando para um trabalho. Não existe um padrão para o assediante, podem ser de forma variada.

E para finalizar, o assédio sexual é só de homens para mulheres? Não. Os homens podem ser assediados por mulheres também, outros homens assediados por homens e mulheres por mulheres. Não existe um padrão de gênero. Porém, as características epidemiológicas indicam que o maior número de casos ocorre na população feminina e tem origem intrafamiliar, sendo a faixa etária com maior incidência entre cinco e 10 anos de idade, por exemplo (Amazarray & Koller, 1998; Habigzang e cols., 2005).

Referências 

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Quem sou eu? Mônica de Paula Silva, também conhecida como Monica Lambiasi, é graduada em Pedagogia desde 2004. Concursada pela Prefeitura de Embu Guaçu – SP, atua há 13 anos como psicopedagoga clínica, área na qual é pós-graduada desde 2006. Em 2008 concluiu pós-graduação em Didática Superior, e em 2009 concluiu pós-graduação em Educação Especial e Educação Inclusiva. Já em 2017 concluiu pós-graduação em neuropsicopedagoga, e atualmente estuda psicanálise e neurociência. Também é escritora.

Contatos: WhatsApp (11) 99763-1603 / Instagram: @lambiazi03

* Por Mônica de Paula Silva