Artigo: como o conteúdo de lutas pode ser abordado entre crianças e jovens nas escolas pelo Brasil
Novo artigo publicado na TATAME trata sobre como as lutas podem ser praticadas na disciplina de Educação Física nas escolas; leia e opine
Artigo fala sobre como as lutas podem ser abordadas nas escolas (Foto: Divulgação)
Segundo a Base Nacional Comum Curricular, as lutas são conteúdo obrigatório na Educação Física Escolar (BRASIL, 2018), sendo manifestações corporais e culturais que trabalham diversas valências, como força, equilíbrio, flexibilidade e agilidade (PEREIRA; DE SOUZA, 2021). Todavia, os conteúdos mais trabalhados pelos professores nas escolas brasileiras são o futsal, voleibol, queimada, rouba bandeira, entre outros. Nesse sentido, países em que a luta não tem uma identidade forte com a sua cultura, pode ficar de fora dos conteúdos escolares, diferente dos países asiáticos (FRANCHINI, 2021).
No estudo de Rosário e Darido (2005), foi visto que, entre as principais causas citadas pelos professores de não trabalharem o conteúdo lutas nas escolas, são a falta de preparo e a insegurança, além da resistência dos alunos com conteúdos novos. Um outro aspecto fundamental é a vivência na graduação desses professores, sendo que em alguns cursos não existe a disciplina de lutas.
Em outros cursos, ela é optativa, e nos cursos que ofertam a disciplina, existem relatos de professores alegando que a mesma não abordou os conhecimentos necessários e/ou encorajaram os mesmos a trabalharem as lutas nas escolas (HEGELE; GONZÁLEZ; BORGES, 2018; LIMA, 2018; SALDANHA, 2018). A formação continuada (cursos e especializações) desses profissionais é importante para melhor qualificar e encorajar os professores licenciados nessa temática (FONSECA; FRANCHINI; DEL VECCHIO, 2013).
Na realidade escolar, os materiais disponíveis nas escolas devem ser levados em consideração. Pensando nisso, Maldonado e Bocchini (2013) realizaram um projeto de inserção do conteúdo lutas na Educação Física Escolar no interior de São Paulo. Esses autores fizeram jogos de oposição, convidaram professores de lutas para fazer vivências (Capoeira e Judô), e passaram o filme Karatê Kid para discussão de agressividade (pessoas que utilizam de forma erronia as lutas para fins agressivos) e a metodologia de ensino tradicional utilizadas nesses esportes.
Do ponto de vista da vivência prática, segundo De Paula e Bezerra (2014), a Capoeira é interessante por não haver contato físico durante as suas rodas. Nesse contexto, ao convidar os professores das modalidades, é importante certificar-se que eles realizam aulas seguras e divertidas (FRANCHINI, 2021).
Uma excelente forma de trabalhar as lutas nas escolas são com os jogos de oposição, que é definido por De Souza Junior e Dos Santos (2010) como jogos lúdicos de oposição entre duplas, trios ou grupos. Esses mesmos autores afirmam que, não necessariamente, o ensino das lutas precisam ser somente técnicos, sendo que os jogos de oposição possuem características semelhantes com as lutas (ataque e defesa). Nesse sentido, os métodos analíticos de ensino (repetições de movimentos técnicos) não são interessantes para as crianças, pois elas perdem a diversão/motivação na aula (FRANCHINI, 2021).
Adicionalmente, para a progressão pedagógica no ensino das lutas para crianças e adolescentes, é interessante começar com jogos de longa distância e ir aproximando ao longo da aula (média e curta), porque diversas pessoas têm restrições ao toque e os jogos iniciais vão desinibindo-as (MORALES et al, 2020). A seguir, irei apresentar algumas descrições com imagens desses jogos de oposição.
Descrições com imagens das atividades:
Atividade A – Esgrima = com uma cartolina ou folha de caderno, separar os alunos em duplas. O objetivo é acertar com a ponta da cartolina ou folha (enrolada) o tronco do colega (não vale no rosto). Os alunos devem se defender e tentar acertar o oponente (ataque e defesa). A cada acerto é contabilizado um ponto.
Atividade B – Pega calda com um pano = em duplas, com um pano colocado na cintura, o objetivo é tirar o pano do colega ao mesmo tempo defendendo o seu (ataque e defesa). Uma possibilidade complementar é dividir grupos (por exemplo: grupo verde vs grupo azul), vence o(s) integrante(s) do grupo que sobrar com o pano na cintura.
Atividade C – Pega calda com dois panos = a mesma da atividade supracitada (B). A principal diferença é que agora serão dois panos para defender e tirar. Aumentando a complexidade da atividade. Uma outra possibilidade é colocar prendedores de roupa na camiseta, e ir tirando o do colega e defendendo o seu.
Atividade D – Fundamentos do boxe (jab e direto) = uma das duplas deverá segurar um balão, o mesmo deverá ditar o fundamento (jab e/ou direto), e o colega deverá executar o movimento no balão. Essa atividade vai trabalhar o processamento da informação e o tempo de reação. É importante, antes da atividade, o professor explicar e executar o jab (soco reto com a mão da frente) e o direto (soco reto com a mão de trás).
Atividade E – Sumô = fazer um círculo no chão com um giz de cera e separar as duplas (importante separar em peso, sexo e estaturas, a mais homogênea possível para deixar o jogo mais justo e equilibrado). O objetivo é tirar o colega de fora do círculo. Perde aquele que pisar fora do mesmo.
Com essas atividades, pode-se observar que não são necessários muitos recursos para trabalhar esses conteúdos (luvas, sacos de pancada, quimono, tatame, caneleiras, bastões e etc). Nem ser faixa preta na modalidade, desde que domine os jogos de oposição e a ludicidade. Um adendo importante é tentar separar os alunos por peso, sexo, altura e envergadura, o mais próximo possível com o objetivo de deixar os jogos mais justos. Algo semelhante ao que acontece na maioria dos eventos competitivos.
Além disso, rodas de discussão são importantes no final da aula (momento de volta a calma), com as possibilidades de abordarem temáticas sociais/éticas importantes como o bullyng, a agressividade, a empatia, e em turmas mais velhas (ensino médio), abordar temas sobre a diferença anatômica e de força entre homens e mulheres. Pensando na organização sequencial da aula, na tabela 1, fiz recomendações práticas nesse sentido.
As lutas estão presentes no cotidiano das crianças e dos adolescentes nos desenhos e filmes (GOMIDE, 2000). O professor pode usar isso ao seu favor, apresentando vídeos para motivá-los a aceitar participar dessas vivências culturais corporais (FRANCHINI, 2021). Os profissionais de Educação Física devem levar em consideração que a formação é sempre continuada. Nesse sentido, é importante a continuidade dos estudos (leituras de livros e artigos) para aumentar as possibilidades de conteúdos ofertados e tomar melhores decisões no campo da intervenção (escola).
Jonatas Deivyson Reis da Silva Duarte
– Profissional de Educação Física
– Mestre em Ciências da Saúde pela Faculdade de Medicina
– Ambas pela Universidade Federal de Mato Grosso
– Especializando em Docência no Ensino Superior pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci.
– Possui experiência em pesquisas relacionadas a lutas, artes marciais e esportes de combate, além de experiência como atleta amador de kickboxing.
– Researchgate: ttps://www.researchgate.net/profile/Jonatas-Duarte-2
– Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/1715413441907784
– E-mail: [email protected]
REFERÊNCIAS
BRASIL. Base nacional comum curricular. Ministério da Educação. Secretaria da Educação Básica. Brasília, DF: MEC/SEB, 2018
DE PAULA, Tania Regina; BEZERRA, Wladimir Pereira. As vantagens do ensino da capoeira nas aulas de educação física escolar. EFDeportes. com, Revista Digital. Buenos Aires, v. 18, n. 188, p, 1-15, 2014.
DE SOUZA JUNIOR, Tácito Pessoa; DOS SANTOS, Sérgio Luiz Carlos. Jogos de oposição: nova metodologia de ensino dos esportes de combate. EFDeportes. com, Revista Digital. Buenos Aires, v , 14, n, 141 p, 1-4, 2010.
FONSECA, Joel Maurício Corrêa; FRANCHINI, Emerson; DEL VECCHIO, Fabrício Boscolo. Conhecimento declarativo de docentes sobre a prática de lutas, artes marciais e modalidades esportivas de combate nas aulas de Educação Física escolar em Pelotas, Rio Grande do Sul. Pensar a prática, v. 16, n. 2, p. 416- 434, 2013.
FRANCHINI, E. Providing youth-friendly martial arts training: brief recommendations. ICM Insigth, v. 8, n. 2, p. 18–26, 2021.
GOMIDE, Paula Inez Cunha. A influência de filmes violentos em comportamento agressivo de crianças e adolescentes. Psicologia: Reflexão e Crítica. Psicologia: Reflexão e Crítica, v.13, n.1. p.127-141, 2000.
HEGELE, Bernhardt; GONZÁLEZ, Fernando Jaime; BORGES, Robson Machado. Possibilidades do ensino das lutas na escola: uma pesquisa-ação com professores de educação física. Caderno de Educação Física e Esporte, v. 16, n. 1, p. 99-107, 2018.
LIMA, M. L. A abordagem das lutas nas aulas de educação física escolar: o que pensam os professores? 2018. 42f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Educação Física) – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, Ijuí, 2018.
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Mateus Machado
Jornalista apaixonado por lutas e Futebol. Trabalhando pela TATAME desde 2015, tive a honra e o privilégio de cobrir grandes eventos de MMA, Jiu-Jitsu e outras artes marciais ao longo dos últimos anos, além de entrevistar alguns dos maiores nomes do mundo das lutas. "Obcecado" por informação, sempre disposto a contar novas histórias e presenciar momentos marcantes.