Especialistas debatem sobre forma ideal de pagamento para atletas de MMA e creem: eles podem – e devem – ser mais valorizados

Especialistas debatem sobre forma ideal de pagamento para atletas de MMA e creem: eles podem – e devem – ser mais valorizados

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Em meio aos números apresentados e as discussões entre lutadores e UFC, o que pensam os “especialistas”? Com uma visão aprofundada sobre o meio do MMA, os jornalistas Marcelo Alonso e Renato Rebelo, e os comentaristas Mário Filho e Carlão Barreto, compartilharam suas respectivas opiniões. Em comum, o fato de todos acreditarem que os lutadores podem ser mais valorizados.

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Referência no mundo das artes marciais mistas, o jornalista Marcelo Alonso, que acompanha os bastidores da modalidade desde os seus primórdios, reconheceu que a forma de pagamento dos atletas precisa ser discutida de uma maneira mais aprofundada, e comentou quais, na sua opinião, seriam as maneiras ideias.

“O esporte evoluiu em muitas áreas nesses 27 anos, mas uma área que precisa evoluir é a divisão do pagamento dos atletas. Parece que no Boxe, na NBA (liga de Basquete americana) e outros esportes, 70% do valor adquirido vai para os atletas, que são os protagonistas. No MMA, são 30%. Isso é um absurdo, precisa mudar. A única maneira de mudar é com os atletas se organizando em associações, sindicatos. Acho que está engatinhando… Evoluímos na antidopagem, passamos esportes centenários em várias áreas, mas nessa parte de remuneração dos atletas, estamos na ‘Idade da Pedra’. A única maneira que vejo disso evoluir é com uma organização de atletas, treinadores e empresários. Eles precisam se unir em algum tipo de organização, onde a expectativa definida seja levada para uma voz única. Hoje em dia, o UFC fica em uma posição muito confortável. Como não existe uma amizade entre os atletas, existe essa coisa do antagonismo, fica fácil para o UFC trabalhar, colocar os atletas uns contra os outros. Eles não se unem nas mesmas demandas. Os empresários serão essenciais nessa conversa inicial. Eles precisam organizar essa entidade, eles vão começar a revolucionar o esporte no sentido de uma melhor remuneração dos lutadores”, explicou Alonso, completando que um “salário mensal” não seria o melhor caminho a seguir.

“O salário mensal não é o caminho. Precisamos pegar a experiência dos ‘primos ricos’, que são as modalidades mais antigas e de mais visibilidade, e achar nosso caminho. A gente não pode ter essa visão sindicalista de que o UFC é o vilão, temos que entender que é tudo um negócio. Os atletas e empresários, em suas reivindicações, não podem entrar numa de radicalizar, porque isso vai inviabilizar o esporte. O Dana White vai bater o pé e o esporte não anda. Tudo tem que ser feito aos poucos, mostrando que algo tem que ser feito, sempre em bons termos, na conversa. O que pode ser discutido é algum tipo de previdência privada, aposentadoria para quem parar. Porque o atleta luta 15 anos, para, e depois e aí? Quem não fez o ‘pé de meia’, está ferrado. Isso também precisa ser discutido entre eles”.

“Evoluímos na antidopagem, passamos esportes centenários em várias áreas, mas nessa parte de remuneração dos atletas, estamos na Idade da Pedra”, Marcelo Alonso.

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Marcelo Alonso é um dos grandes nomes do jornalismo de lutas no Brasil (Foto arquivo pessoal)

Comentarista dos canais FOX Sports no Brasil, Mário Filho também acompanha o esporte há anos e, consequentemente, suas constantes mudanças. Ao falar sobre o tema, Mario disse que um salário mensal seria uma “boa saída” e algo que pode se tornar realidade, porém, não a curto prazo. O especialista também destrinchou os posicionamentos de Jon Jones – que afirmou que não lutaria até entrar em um acordo com o UFC sobre salários – e Conor McGregor, que recentemente anunciou sua aposentadoria do MMA.

“Um salário mensal pode se tornar realidade, mas é muito confuso, especialmente na ‘Era Dana White’, seria uma tremenda reviravolta. Não vejo isso a curto prazo. Em relação à insatisfação dos atletas por conta dos salários, bolsas e tudo mais, quando o cara é campeão, acho uma reivindicação muito legítima, até mesmo apelar para a aposentadoria, não deixa de ser uma negociação, é uma forma de protestar. No caso de Jon Jones e do Conor McGregor, por mais que os dois estejam muito ricos, eles são, disparadamente, as grandes estrelas, então se eles estão insatisfeitos, podem perfeitamente exigir melhores condições, porque eles fazem com que a engrenagem funcione muito mais. Eles são dois dos exemplos que fizeram do MMA muito mais popular em nível mundial. A partir do momento que você é campeão, tem todo o direito de exigir uma parte maior do bolo, acho até que a Amanda Nunes reforçaria essa corrente. Não sendo campeão, se vai ser atendido ou não, depende do quanto essa pessoa desperta atenção. O atleta precisa ser midiático e performático em todos os aspectos possíveis, principalmente no octógono. Se a pessoa compõe todos esses elementos, acho que ela tem que ser melhor remunerada, sem dúvida”.

Ex-lutador e hoje comentarista de MMA e Jiu-Jitsu, Carlão Barreto seguiu a opinião de Mário Filho a respeito de um salário aos atletas, no entanto, afirmou que o pagamento poderia ser direcionado aos 15 lutadores principais do ranking de cada categoria, enquanto os outros atletas teriam “ajuda de custos”. O faixa-preta também atentou para outros pontos importantes relacionados a benefícios para os profissionais do MMA.

“Um salário seria o mais justo para os atletas. Talvez não todos, vai depender da estrutura da empresa, se o negócio tem solidez para aguentar isso… Mas, talvez, os 15 primeiros do ranking poderiam receber um salário, ter uma grana fixa. Os outros, talvez, poderiam ter uma ajuda de custos, quando for lutar, recebe uma ajuda para poder treinar, se alimentar, independentemente de patrocínio. Mas vai depender da saúde financeira de cada organização e a boa vontade dos donos dos eventos em distribuir um pouco a renda com os atletas, afinal, eles são as estrelas do show. Talvez, no futuro, possamos ter isso. Vai depender muito do crescimento do esporte, da evolução, de entrar novos patrocinadores/investidores para fazer o esporte crescer. Também é preciso pensar em outros benefícios, como planos de aposentadoria, pensar nos caras que já estão parando de lutar, para que possam envelhecer com segurança, afinal, se trata de um esporte muito lesivo e de muita intensidade”, argumentou Carlão.

Jornalista dos canais ESPN e fundador do Sexto Round, Renato Rebelo deu detalhes de como a engrenagem do UFC funciona, o que torna a franquia a maior do mundo no MMA, e explicou que benefícios aos atletas só passarão a ser mais discutidos e, consequentemente, aplicados, se os mesmos se unirem.

“É um tema difícil de ser solucionado. O UFC tem como principal foco a sua marca, é você girar o mundo com o seu espetáculo e as pessoas, onde quer que estejam, vão sair de casa para ver o UFC. É uma estratégia comercial que eles adotaram desde que o Dana White e os irmãos Fertitta compraram, porque eles entenderam que se a estratégia fosse baseada em um, dois ou três indivíduos, isso acaba e o evento vai para o buraco. A gente lembra o que aconteceu com o evento Elite FC depois que o Kimbo Slice foi nocauteado, o evento faliu, porque dependiam dele. Eles fizeram uma coisa mais voltada para a máquina, de propaganda. O que acontece é que a execução do lucro deles (UFC) para os atletas é menor comparada à outras ligas. O UFC executa 20% dos lucros para pagar os atletas. Mas, por outro lado, isso permite que o UFC seja o único evento de pé durante a pandemia, permite que eles possam investir para fazer eventos numa ilha da luta, serem líderes de mercado, empresa vendida por 4 bilhões, ter três institutos de performance, milhares de funcionários espalhados pelo mundo e muito mais. A máquina recebe uma grana maior do que em ligas em que o atleta recebe mais, e aí é questionável, o que é sustentável ou não. 20% é pouco, o que deveria ser, 50%? Mas como funcionaria isso? Será que se o UFC pagar 50% aos atletas, não vai vir um concorrente que vai pagar menos e tomar o mercado deles, levando o UFC à falência?’ Achar esse ponto para que a empresa seja líder de mercado, para não ir à falência e deixar os atletas satisfeitos ao mesmo tempo é o ponto ideal. Está tendo muita insatisfação (dos lutadores) nos últimos tempos, então isso é sinal que, de repente, eles podem ceder um pouco. É um bom senso, um meio termo, porque se todo mundo estiver insatisfeito, no fim do contrato, o atleta vai para a organização rival. Se os atletas se unirem e, numa só voz, demandarem um piso maior ou mais dinheiro do patrocinador, provavelmente o UFC vai ter que ceder, mas no esporte individual, é mais difícil ter essa união de atletas. Não é um tema fácil”, encerrou.